Por Celso Niskier,
No último dia 12 de setembro, o Ministério da Educação e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgaram os resultados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) 2021. Aplicado para cursos de bacharelado, licenciatura e tecnológico de 30 áreas, e com mais de 492 mil inscritos, o Enade 2021 foi o primeiro desde o início da pandemia e o maior já realizado desde a sua criação.
Entre os destaques está a consolidação da educação a distância como a modalidade de ensino com o maior número de estudantes. Pela primeira vez, 52% dos alunos que fizeram a prova estavam matriculados na EAD. Outra constatação foi a de que 21% dos estudantes das IES privadas com fins lucrativos e 20,9% das privadas sem fins lucrativos pensaram em trancar ou desistir do curso devido às dificuldades geradas pela pandemia para a continuidade dos estudos.
Ainda em relação ao período conturbado que vivemos entre 2020 e 2021, foi confirmada a percepção de que as instituições particulares de educação superior se adaptaram melhor e mais rapidamente, em relação às públicas, para ofertar aulas remotas no início da pandemia. O percentual de estudantes satisfeitos com o desempenho das IES privadas com fins lucrativos é de 67,3% e das sem fins lucrativos de 74,4%, ante 28,1% dos alunos das universidades públicas estaduais e 21,8% das públicas federais.
Sem grandes variações no desempenho geral das instituições, cabe agora a cada uma analisar seus resultados e, se for o caso, tomar as medidas necessárias para seguir na jornada rumo ao desenvolvimento institucional. Afinal, ainda que sua metodologia possa ser questionada, o Enade consiste no principal instrumento do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) e seus resultados devem funcionar como o Norte para quem busca ofertar um ensino de qualidade.
Além do aspecto qualitativo, também quero destacar aqui o outro lado da educação superior apresentado pelo exame: o humano. No que talvez seja a melhor radiografia do perfil do estudante de graduação do país, o Enade nos mostrou que a educação superior segue sendo majoritariamente feminina (64%) e composta por pessoas brancas (46%), de famílias com renda familiar de até três salários mínimos (65%) e com pais sem graduação (75%).
Considerando que 67% dos participantes do Enade cursaram a educação superior em instituições particulares, esse panorama nos convida a fazer uma análise para além da qualidade da oferta: a efetividade das políticas públicas de acesso. Embora a maior parte dos concluintes sejam de famílias de baixa renda, apenas 1,2% contaram com o suporte do Fies e 6,2% receberam bolsas integrais do ProUni.
Ante números tão baixos, ganha destaque o empenho das instituições particulares para garantir a permanência desses estudantes na graduação. Por iniciativa própria, 12,6% dos graduandos contaram com bolsas fornecidas pelas instituições e 2,4% com financiamento também viabilizado pelas IES, ressaltando que a responsabilidade social das instituições particulares se faz presente tanto naquilo que é a sua razão de existir – ofertar uma educação superior de qualidade – quanto na incidência para a transformação da sociedade na qual está inserida.
Desta forma, ao mesmo tempo em que atende à estrutura do Sinaes para o mapeamento da qualidade das graduações, o Enade também funciona como um eficiente instrumento de descortinamento da realidade e das necessidades dos nossos estudantes, no que consiste em um complemento fundamental aos dados coletados pelo Censo da Educação Superior. É a realidade nas suas mais distintas faces.
Contudo, sem questionar a relevância do exame, reforço a importância de que a sua aplicação seja revista de modo que o estudante seja comprometido com o resultado final da prova, garantindo resultados mais aderentes ao que é realmente ofertado pelas IES. E não custa lembrar que o Enade é apenas uma das variáveis que resultam no conceito do curso, ao lado de aspectos como as avaliações in-loco e a formação e a dedicação docentes. Por fim, ressalto que existem outros fatores indicativos da qualidade de um curso, como a empregabilidade dos egressos.
Medir qualidade é um exercício complexo e os resultados de um único exame não podem ser tomados como verdade absoluta. A cesta de variáveis é ampla e precisa ser considerada em toda a sua extensão.
Fonte: ABMES